Por Adriano Salgado • 1 de setembro de 2021
Nesta terça-feira (31/8), a diretoria da ADUFLA Seção Sindical, entidade representativa dos docentes e das docentes da Universidade Federal de Lavras (UFLA), emitiu nota à comunidade acadêmica sobre o papel dos conselhos deliberativo da instituição. Entre os vários aspectos apontados pela entidade, a nota questiona a real representatividade do Conselho Universitário (CUNI) e do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) sob a ótica daqueles que tais conselhos deveriam zelar, ou seja, o corpo docente, técnico-administrativo e discente da instituição.
A nota aponta, entre outros pontos, a falta de espaço de debate amplo com as entidades representativas da comunidade acadêmica acerca de temas importantes; o alinhamento da direção da universidade aos interesses do Governo Federal em detrimento de um maior diálogo interno; e ainda, a falta de transparência no análise e na tomada de decisões em questões que impactam diretamente o dia a dia da universidade, que acabam sendo definidas sem haja a devida atenção aos reais interesses dos agentes envolvidos.
Confira abaixo a íntegra do documento:
CEPE e CUNI: afinal, a quem representam?
Na terça-feira, dia 24 de agosto, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFLA, em uma reunião aligeirada, deliberou pelo retorno gradual das e dos estudantes às aulas presenciais, um dia depois de ser publicada a Portaria da Reitoria nº 787 que determina o retorno das servidoras e dos servidores docentes e técnico-administrativos ao trabalho presencial a partir do dia 8 de setembro. Mais uma vez a diretoria executiva da UFLA, sempre buscando ser a pioneira no desmonte das universidades públicas e na precarização da educação brasileira, demonstra que o seu compromisso se restringe aos interesses particulares de indivíduos e grupos que administram a universidade como se esta fosse uma empresa privada e não uma instituição pública de ensino superior, cuja finalidade declarada no seu estatuto, artigo 5º, é “a melhoria das condições de vida das pessoas e da coletividade”.
Diante desse quadro, pergunta-se: o CEPE – formalmente constituído por representantes da administração central da Universidade, das servidoras e dos servidores docentes e técnico-administrativos, das e dos discentes, bem como das coordenações dos cursos de graduação e programas de pós-graduação, uma representante da comunidade e representantes de equidade, diversidade e inclusão – ao aprovar o retorno gradual das e dos estudantes às aulas presenciais, representou os interesses de quem, se não houve discussão do tema com as entidades representativas de nenhuma das categorias com assento no conselho? Se na reunião do CEPE não foram consideradas as manifestações de entidades e coletivos enviadas ao conselho, expressamente contrárias ao retorno presencial? Se as oposições têm sido silenciadas nesses espaços em um clima de coerção e ameaças a conselheiras e conselheiros que se comprometem com o diálogo democrático? Se neste momento a crise sanitária está longe de ser superada no Brasil, os dados científicos apontam os riscos que a reabertura das instituições de ensino representa para a população, e isso tudo não foi tratado nem considerado?
A justificativa de estar “atendendo à comunidade acadêmica”, que supostamente desejaria o retorno das atividades presenciais, não tem sustentação na realidade. O CEPE ignorou o resultado da consulta feita às e aos estudantes pelo DCE, como também as manifestações das entidades representativas das e dos docentes, estudantes e servidoras e servidores técnico-administrativos que contrariavam o discurso da direção executiva da UFLA. Na consulta feita pelo DCE, 70,2% das e dos estudantes responderam que não se sentem seguras ou seguros para retornar às aulas presenciais, e 67,3% disseram que vão cancelar a matrícula nas disciplinas que exijam o retorno. Considerando-se que 65,2% das e dos estudantes afirmaram não ter recebido sequer a primeira dose da vacina – estando, portanto, em situação de risco maior – ao ignorar esse grupo a UFLA mostra que de fato não se preocupa com a vida de ninguém.
Com frequência deliberações de assembleias gerais da ADUFLA são deslegitimadas pela direção executiva da Universidade. Em diversas ocasiões o Reitor João Chrysostomo declarou que não dialoga com a ADUFLA porque a sua Diretoria estaria agindo como “inimiga” (citação literal) da gestão da universidade. No que concerne à ADUFLA, nada é mais inverídico. Contudo, ao fazer isso, a direção executiva da Universidade revela sua aversão à democracia, silenciando e tentando intimidar as vozes dissonantes, no mesmo estilo do governo Bolsonaro, com o qual parece ter ligações umbilicais. A Diretoria da ADUFLA é formada por docentes da UFLA, o que por si só deveria ser suficiente para que a Reitoria se abrisse ao diálogo. Além disso, a representatividade da ADUFLA decorre do fato de que a Diretoria da entidade é eleita por suas filiadas e seus filiados e, ao contrário da direção executiva da Universidade, tem garantido a todas e todos o direito de se manifestar nas assembleias e plenárias que realiza. Não é o que acontece nos conselhos superiores da UFLA, que sistematicamente ignoram aquelas e aqueles que querem participar de suas reuniões, que deveriam ser abertas e públicas, por serem atos administrativos não classificados como “reservados”, “secretos” ou “ultrassecretos” nos termos do art. 24 da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/11). Em que momento as conselheiras e os conselheiros que compõem o CUNI e o CEPE ouvem e dialogam com aquelas e aqueles que supostamente representam?
Houve uma reestruturação de cargos na Universidade recentemente. Essa mudança – rejeitada mais de uma vez pela comunidade acadêmica anteriormente, foi aprovada em plena pandemia, sem diálogo amplo com essa mesma comunidade. Uma verdadeira aplicação de uma ”doutrina do choque” – fazendo mudanças profundas, sem democraticidade real, de forma rápida e impositiva, num período excepcional em que os órgãos coletivos da Universidade ainda estavam se recuperando do impacto da imposição de isolamento social para controlar a disseminação de uma doença letal que cobrou a vida de quase 600.000 brasileiras e brasileiros – dentre essas pessoas muitas e muitos de nossos entes queridos. Isso gerou um CUNI e um CEPE “escolhidos a dedo” pela direção executiva, que estão funcionando com uma minoria de representações eleitas diretamente para exercer a função de representação e uma maioria indicada pela referida direção para aprovar tudo o que é do seu interesse, ainda que contrariando o interesse público. No caso do CUNI, a representação das unidades acadêmicas fica comprometida pelo fato de que suas diretorias ainda não foram eleitas, sendo meras nomeações pro tempore feitas pelo Reitor, o que favorece um alinhamento das unidades com a diretoria executiva da Universidade. Emulando o governo Bolsonaro, a direção executiva da UFLA está aproveitando a pandemia para “passar a boiada”, com a coadjuvância de parte das conselheiras e dos conselheiros do CUNI e do CEPE que, em geral, não representam quem deveriam representar e que se reúnem sempre a portas fechadas.
A ADUFLA está atenta ao que acontece em todas as instâncias da universidade e continuará trabalhando para que todas as manifestações possam ser acolhidas e respeitadas, e para que a UFLA tenha uma gestão verdadeiramente democrática e comprometida com o desenvolvimento humano e social no Brasil. Dado que as instâncias que deveriam representar a comunidade acadêmica ignoram suas reivindicações, em um grave ataque aos preceitos democráticos que deveriam reger a gestão da universidade pública – preceitos estes previstos nos princípios e regras da Constituição da República e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), notadamente em seu art. 56 -, avançaremos na mobilização da greve sanitária contra o retorno das atividades presenciais em condições inseguras, conforme deliberação da categoria docente na Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 16 de agosto. Para tanto, em conjunto com SINDUFLA, DCE e APG, entidades representativas da comunidade acadêmica, convidamos toda a comunidade a participar da Assembleia Geral Unificada a ser realizada no dia 2 de setembro de 2021, às 17h, que pautará a greve sanitária e promoverá a discussão coletiva que deveria respaldar os processos decisórios na Universidade.
A Universidade Pública não pode se reduzir a uma instituição subjugada aos interesses particulares daquelas e daqueles que se aliam ao projeto de um governo reacionário e genocida, ainda que o preço a pagar seja, num futuro próximo, a completa destruição da Universidade e da Educação Pública no nosso país.
Saudações Sindicais e Democráticas,
Associação das e dos Docentes da Universidade Federal de Lavras – ADUFLA
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