Por Adriano Salgado • 2 de janeiro de 2018
Professoras Iraziet da Cunha Charret e Giovana Augusta Torres formaram a primeira presidência feminina da entidade no triênio 2004/2006
A participação das mulheres ao longo desses 50 anos da ADUFLA resultou em passagens importantes na história da instituição. Em 1975, a professora Janice Carvalho foi a representante da associação na assembleia de criação do ANDES, na cidade de Piracicaba-SP. De lá para cá, a presença feminina se fortaleceu na ADUFLA culminando com a eleição das professoras Iraziet da Cunha Charret e Giovana Augusta Torres para presidente e vice-presidente na primeira diretoria formada só por mulheres na linha de frente, na gestão 2004/2006. Mais recentemente, a entidade viria a ter outra presidência feminina com Júlia Moreto Amâncio, entre 2014/2016.
As duas ingressaram juntas na UFLA, em novembro de 1997, na chamada “turma dos 109”, um grupo grande de professores contratados naquele ano. Ambas tinham vivência do movimento estudantil e chegavam num momento de transformação efetiva da UFLA, que deixava de ser uma instituição exclusivamente agrária para se tornar uma Universidade.
Iraziet conta que no ano seguinte à sua chegada já se viu dentro da greve de 1998, que lutava entre outras questões contra as políticas do Governo FHC de desmonte da universidade pública e da carreira dos servidores. Internamente, a então ASPESAL passava por um momento conturbado, com dívidas e com pouca representatividade. Em 2000, assumiu o cargo de secretária na gestão do professor José Tarcísio Lima e atuou diretamente no processo de transformação da entidade em uma seção sindical do ANDES. “Foi um processo de reestruturação e saneamento da entidade, de aproximação com os aposentados, de grande mobilização que culminou na transformação da associação em seção sindical. Não tínhamos amparo legal. Os professores eram obrigados a se filiarem ao SindUFLA para poder cobrar seus direitos em eventuais ações na Justiça, por exemplo. Era uma necessidade, e a categoria entendeu, dando-nos o aval para a mudança, que aconteceu no final daquela gestão”, lembra a professora.
No triênio seguinte, Iraziet assumiria a vice-presidência na gestão do professor Roberto Alves Braga Jr. Foi uma época de construção da representação sindical da entidade, do fortalecimento da base política, de mobilização, de mostrar que a entidade não era de um grupo apenas, mas de toda a categoria. Foi também o início de um embate sério em relação à participação cada vez maior das fundações dentro das universidades, num processo onde a UFLA se destacava no cenário nacional devido a um processo de mercantilização interna que tomava proporções alarmantes via a criação dos cursos à distância que eram pagos.
Nessa mesma gestão, Giovana foi primeira secretária e também vivenciou o embate sobre a relação entre as Fundações e a Universidade. “Quando ingressei na UFLA, a ideia que se vendia era de que o sistema de cobrança via fundação era bom para a universidade e para o professor. Era um modelo instituído e no qual grande parte dos docentes eram envolvidos para captação de recursos. A partir das questões levantadas pelo ANDES-SN muitos/as docentes começaram a se dar conta das irregularidades envolvidas e do desvio de energia que deveria estar sendo destinada à graduação, à pós-graduação, à pesquisa e à extensão. Foi sendo construído um consenso entre muitos que chegaram junto comigo de que tínhamos que defender a universidade como uma instituição pública e gratuita. E o que acontecia na UFLA era, na nossa opinião, um claro processo interno de privatização através da fundação”, conta ela.
Na gestão seguinte foi eleita como vice-presidente da ADUFLA, junto com a Iraziet, em um momento em que a discussão sobre as fundações chegara ao seu ápice. Ela conta que eram embates duros entre aqueles que defendiam o modelo, um grupo forte e influente dentro da instituição, e os engajados em defender os princípios que caracterizam a universidade pública. “A construção daquela diretoria era o resultado do enfrentamento dessa questão, que era inclusive uma bandeira do ANDES e que foi levada adiante pela ADUFLA. Tínhamos inclusive um dossiê interno preparado na gestão anterior, do professor Roberto, sobre isso. Essa disputa entre o público e o privado era o centro dos embates”, destaca Giovana.
Iraziet lembra que no auge da polêmica ela presidiu uma assembleia que considera a mais difícil da ADUFLA entre todas nas quais participou. “Fui com a advogada da ADUFLA do meu lado. Me sentia ameaçada. Nos chamavam de ‘vermelhinhos’, por sermos na maioria simpatizantes do PT. Nos acusavam de estarmos tirando o ganha pão das famílias. Éramos massacrados”.
Mais tarde, durante o governo de Luís Inácio Lula da Silva, eleito em 2002, o próprio MEC acabaria por regulamentar a atuação das fundações nas universidades, dentro da reestruturação das Instituições de Ensino Superior. “A política de resgate das universidades do governo Lula, com recuperação de salários, mais recursos para as IFES e a própria regulamentação da atuação das fundações esvaziou a discussão em torno da questão. Para nós que assumimos a postura de defender a universidade pública e gratuita nos tempos de crise foi uma recompensa assistir mais tarde o fortalecimento do caráter público das universidades via financiamento oficial. Foi gratificante testemunhar a ampliação do sistema de ensino superior federal e o crescimento da pesquisa, da pós-graduação e da extensão com base nos marcos regulatórios de qualidade que devem pautar a universidade. Valeu a pena!”, conta com certo orgulho a professora Giovana.
Uma outra meta daquela gestão ‘feminina’ da ADUFLA foi a construção da nova sede da entidade, já que o antigo imóvel no Campus Histórico teria que ser desocupado. “Com as finanças em dia após as gestões dos professores José Tarcísio e Roberto, pudemos executar o projeto da nova sede, mais adequada ao dia-a-dia da entidade e mais perto dos associados. Esse foi um outro legado que deixamos na nossa gestão, fruto do trabalho de toda a equipe e que resultou na inauguração do prédio sede atual em novembro de 2006”, ressalta a professora Giovana, que hoje ocupa o cargo de diretora de mobilização da entidade. “Infelizmente, todo o esforço para privatizaras universidades federais, com estrangulamento da carreira dos servidores públicos e do financiamento das instituições na era FHC voltou a nos assombrar nos últimos tempos e, aparentemente, com mais força. Por isso, o momento é, de novo, de luta acirrada em defesa de uma universidade pública, gratuita e de qualidade”, alerta Giovana.