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Educação vira palco de disputa entre as alas militar e ideológica em mais uma chaga do governo Bolsonaro


Por Adriano Salgado • 7 de julho de 2020

Fundamental para a construção da cidadania e o progresso do país, Ministério segue sem titular. Nomeação está empacada na escolha de um nome que deve agradar às alas militar e ideológica, após os fiascos Weintraub e Decotell

Sem ministro há 18 dias e sem projeto estruturado há mais de um ano, a educação se tornou o flanco mais vulnerável do governo federal, ao ponto de até Jair Bolsonaro reconhecer que “a educação está horrível no Brasil”. A afirmação, dada em resposta a uma apoiadora na porta do Alvorada, é vista como o maior consenso do país.
Em 16 meses, não há um projeto claro, nem tampouco diálogo direto com os governos municipais, estaduais e universidades. Durante os 14 meses sob o comando de Abraham Weintraub, as marcas foram a polêmica e poucas realizações. O presidente está insatisfeito por chegar, praticamente, à metade do mandato sem qualquer resultado prático para chamar de seu nesta seara, peça-chave das promessas de campanha em 2018.
As restrições dos militares e dos olavistas tornam ainda mais difícil o desafio de escolher um ministro. Bolsonaro se vê espremido entre os dois segmentos e decidiu que, esta semana, vai resolver o problema com um ministro de perfil conservador e que transite nas duas correntes. 
O presidente quer alguém que resolva as reclamações do setor, porém a cada escolha seus aliados entram em cena. O secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, por exemplo, não suportou o bullying dos bolsonaristas e pediu para sair antes mesmo de entrar. O próprio Bolsonaro, que o convidara na semana passada, titubeou na indicação ao não defender Feder dos ataques dos apoiadores que se autointitulam “raiz”. Ao ficar exposto, o secretário seguiu o conselho de amigos: avisou em suas redes sociais que continuaria o trabalho no Paraná.
A recusa de Feder reacende as pressões sobre o presidente e expõe a disputa interna no governo. Os militares, que indicaram Carlos Decotelli, por exemplo, sonham com um ministro técnico, independentemente de amarras ideológicas. Mas os radicais querem destaque para a ideologia. “O escolhido não deve ser ideologicamente neutro, tem que ser um conservador de raiz!”, sugeriu o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) em seu twitter, ressaltando que a escolha é “exclusiva” do presidente. E, no meio disso tudo, há uma nova corrente interessada no cargo: o Centrão, que, depois da posse do deputado Fábio Faria nas Comunicações, declarou aberta a caça a um ministério para os senadores.
Com recusa de Feder — que chegou a chamar Bolsonaro de “estadista”, antes de ser ultrapassado por Decotelli —, passou a circular nomes como os de Aristides Cimadon, reitor da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Anderson Ribeiro Correia; reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), que teria o aval das alas militar e ideológica; Ilona Becskeházy, secretária nacional de Educação Básica; e Sérgio Sant’Anna, assessor especial da pasta.
Desafios do cargo:
Ala ideológica 
Conseguir uma trégua duradoura com o grupo sob orientação do escritor Olavo de Carvalho, que contesta a ciência –– chegou a dizer que faz sentido a teoria do terraplanismo, assim como afirmou que a pandemia da covid-19 é uma empulhação –– e considera as universidades públicas “centros de formação de militantes comunistas”. O MEC tem alguns dos representantes dos ideológicos, como Carlos Nadalim, secretário nacional de Alfabetização e defensor do ensino em casa, o controverso home schooling.
Coordenação na pandemia 
Estabelecer uma coordenação nacional na política educacional neste cenário de doença fora de controle. Entre os principais desafios estão a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que ainda não tem data marcada e nem se sabe se será neste ano, a retomada das aulas presenciais em todo o país e uma política de combate à exclusão digital.
Reestabelecimento do diálogo 
Desinterditar as conversações do MEC com secretarias estaduais e municipais de Educação, entidades superiores de ensino (principalmente universidades e institutos federais) e o Congresso.
Fundeb e FNDE
O novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação precisa ser aprovado no Congresso. E o ministro tem ainda de dar uma resposta convincente para uma concorrência (sustada), do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, de mais de R$ 3 bilhões para a compra de laptops. Somente uma escola em Minas receberia 30 mil aparelhos, o que daria 117 por aluno.
Quem esteve na pasta:
Carlos Alberto Decotelli
Durou apenas cinco dias e nem sequer tomou posse. Saiu devido às mentiras que colocou no currículo que mantém na Plataforma Lattes — o que não o impediu de, na mais recente atualização, apresentar-se como ministro, apesar da passagem meteórica.
Abraham Weintraub 
Olavista feroz, deixou o Brasil antes mesmo de a demissão do MEC ser oficializada. Indicado pelo governo para diretoria no Banco Mundial, nem assumiu e encontra resistências de funcionários da instituição, que pedem que seja vetado por manifestações racistas –– como o tuíte que ironizou os chineses pela maneira de falar o português. Está no inquérito das fake news por ter chamado os ministros do Supremo Tribunal Federal de “vagabundos” numa reunião ministerial. Tentou, ainda, interferir nas universidades federais para nomear reitores biônicos e, como último ato à frente do ministério, revogou as cotas para cursos de pós-graduação –– o que já foi derrubado.
Ricardo Vélez Rodríguez 
O colombiano naturalizado brasileiro, indicado por Olavo de Carvalho, durou apenas três meses. Porém, no pouco tempo que ficou, enumerou polêmicas: afirmou que a universidade não é para todos, disse que “brasileiro viajando é um canibal” e pediu para que pais filmassem filhos estudantes cantando o Hino Nacional. 

Fonte: Correio Braziliense

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