Por Adriano Salgado • 17 de janeiro de 2020
Dados da Câmara demonstram que a Comissão de Educação promoveu 436 horas de debates e votações no ano passado. O número é quase quatro vezes maior que o registrado em 2018
Os deputados federais nunca debateram tanto a educação brasileira quanto em 2019. Segundo os deputados, isso representa uma resposta do Legislativo aos posicionamentos do ministro Abraham Weintraub – reação que rendeu à Educação o título de comissão com mais horas de sessão na Câmara dos Deputados em 2019.
A Comissão de Educação desbancou comissões tradicionais, que costumam ocupar os deputados em sessões que se estendem noite adentro, como a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Por isso, ampliou seu protagonismo e conseguiu emplacar projetos questionados pelo governo como o que destinou parte dos recursos do fundo da Lava Jato para a educação básica e o que garantiu a presença de psicólogos e assistentes sociais nas escolas.
Ao todo, a comissão aprovou 47 projetos de lei e 262 requerimentos durante 25 reuniões deliberativas. Além disso, foram realizadas 35 audiências públicas, 23 palestras e 15 seminários. Os debates com a sociedade civil somaram quase 379 horas e contaram com a participação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, em três ocasiões distintas. Na última passagem pela Câmara, por exemplo, Weintraub passou o dia inteiro discutindo o que o levou a dizer que há plantações de maconha nas universidades federais.
As declarações e atitudes polêmicas do ministro da Educação do governo de Jair Bolsonaro, por sinal, são apontadas pelos deputados como uma das razões do aumento do debate sobre a educação na Câmara. “A quantidade de polêmicas registradas na educação estimulou a apresentação de requerimentos e audiências públicas. O próprio ministro suscitou muito debate, por conta de declarações que fogem do real problema da educação”, afirmou o presidente da Comissão de Educação da Câmara, Pedro Cunha Lima (PSDB-PB).
Também por conta disso, lembra Cunha Lima, a educação firmou-se como um agente de polarização política no país. Polarização que gerou uma reação dos deputados, tanto dos que apoiam quanto dos que discordam do posicionamento adotado pelo governo Bolsonaro nesta área. Isso levou, portanto, a comissão a debater temas como a escola sem partido, a militarização das escolas e os mecanismos de escolha dos reitores das universidades federais.
“É na educação que acontece boa parte das brigas ideológicas. E isso acaba gerando muita discussão”, concorda o deputado Felipe Rigoni (PSB-ES), que se colocou como uma voz de oposição na Comissão de Educação junto com deputados como Tabata Amaral (PDT-SP) e Professora Marcivania (PCdoB-AP).
“O fato de ter um ministério completamente apático e um ministro que não se preocupa com o que de fato acontece na educação contribuiu para que nós nos uníssemos em prol de algo que é muito importante para o futuro do país, a educação”, avalia Rigoni. O presidente da Comissão de Educação lembra, por sua vez, que a base do governo também conseguiu fazer muito barulho e obstrução nas votações do colegiado.
Pedro Cunha Lima ainda afirma que também contribuiu com o crescimento da Comissão de Educação o fato de que muitos deputados de primeiro mandato participam do colegiado, sejam os novatos de oposição, como Rigoni e Tabata, ou os novatos de direita, como a Professora Dayane Pimental (PSL-BA) e Chris Tonietto (PSL-RJ). “Também é muito fruto da atividade dos membros da comissão. Nós tentamos deixar a comissão funcionando o máximo possível, ocupando sempre que havia disponibilidade os plenários da Câmara”, acrescentou.
Avaliação
Os membros da Comissão de Educação, contudo, enxergam de formas distintas o saldo desse aumento do debate sobre a educação. Rigoni, por exemplo, acredita que a bancada da educação saiu mais forte e, consequentemente, mais preparada para enfrentar os próximos desafios da área, como o novo Fundeb.
Segunda vice-presidente da comissão, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) também acha que o debate foi positivo por ampliar a visibilidade e o conhecimento público sobre as questões abordadas pelo Ministério da Educação (MEC). Mas lamentou o fato de a polarização política ainda persistir sobre a educação. “É positivo para o esclarecimento da sociedade, porque descortina a verdadeira face das políticas que estão sendo implementadas por esse governo, que baixa portarias de forma autoritária para quase tudo nas escolas. O que lamentamos é que esse debate ainda não conseguiu convencer o governo a não desconstruir o que há de positivo na educação”, avaliou a deputada de oposição.
O presidente do colegiado concorda que um dos desafios para este novo ano legislativo é fazer com que os debates sejam mais produtivos na Comissão de Educação. “É legítimo debater questões como a das plantações de maconha. Mas minha grande preocupação é que isso desvie o debate do que realmente importa e ocupe o debate da educação pública. Temos que devolver o debate para o foco dos problemas da educação, debatendo assuntos como a formação e a atratividade da carreira dos professores, a falta de vaga nas creches, a base nacional curricular, o Fundeb”, avaliou Pedro Cunha Lima.
Desafios para 2020
O Fundeb, por sinal, é apontado como o grande assunto da Comissão de Educação para 2020. Os deputados que integram o colegiado acreditam que o ministro Abraham Weintraub deve continuar gerando polêmica e promovendo debates acalorados na Câmara, mas afirmam que a prioridade é aprovar o novo Fundeb para garantir que o financiamento da educação básica continue a partir de 2021.
O debate é necessário porque o atual Fundeb expira no fim deste ano, o que exige uma nova regulamentação para que o fundo continue operando nos próximos anos. A discussão, por sinal, já começou, com base na proposta de emenda à Constituição (PEC) que foi apresentada pela Professora Dorinha (DEM-TO) e sugere o aumento gradual de 10% para 40% da compensação oferecida pela União ao Fundeb. O percentual, porém, não foi aceito pelo ministro Weintraub, que prometeu enviar uma nova proposta sobre o Fundeb para a Câmara, o que deve acirrar os debates sobre o fundo neste ano.
Fonte: Site Congresso em Foco